Assistimos na semana passada, com certo espanto, o pleito da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) para a antecipação da cobrança do imposto integral para os carros eletrificados importados. Os fabricantes querem que o governo federal quebre a regra criada no ano passado, que regulamentou uma taxação gradual em etapas até julho de 2026, quando se chegaria ao valor de 35%.
Representantes das montadoras se reuniram às portas fechadas com o ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, o vice-presidente Geraldo Alckmin, para reclamar que a taxação gradual não está surtindo efeito em frear o que chamam de “concorrência desleal” dos produtos importados – principalmente da China.
Em janeiro deste ano os carros eletrificados importados começaram a ser taxados em 10% (EVs), 15% (HEVs) e 12% (PHEVs). E, neste mês de julho, os valores passam para 18%, 25% e 20%, respectivamente. Mas para os fabricantes nacionais isso é pouco.
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Muito desse ‘desespero’ das montadoras locais se deu pelo fato de os dois maiores importadores de carros eletrificados da China, BYD e GWM, não terem repassado para os consumidores os 10% de taxação. Os carros das duas marcas estão praticamente com os mesmos preços do ano passado e, em alguns casos, até baixaram de valor.
Podemos afirmar que, mesmo com o novo aumento da taxação agora de julho, os preços dos modelos mais vendidos das duas gigantes deverão ser mantidos. Isso porque, tanto GWM como principalmente a BYD encheram navios com dezenas de milhares de veículos e estão com seus pátios lotados. São carros que entraram no país sem pegar o segundo aumento do imposto.
Acompanhando os comentários nas publicações sobre o tema, podemos notar uma virada de chave da opinião pública. Era quase unânime a defesa pelo cumprimento da regra anterior, ou seja, a favor dos importadores chineses.
O que muitos disseram é que os fabricantes nacionais deveriam se preocupar em alcançar a qualidade dos produtos chineses, o que elevou o patamar de acabamento e de exigência do consumidor.
Por que pagar R$ 150 mil em um carro cheio de plástico duro, poucos equipamentos de série e tecnologias oferecidas apenas como opcionais caros, se posso pagar o mesmo ou menos em produtos superiores?
Não é nem mesmo preciso entrar no mérito da comparação dos produtos para saber que esse pleito da Anfavea soou como um ato de desespero diante da produção acelerada e robusta dos chineses que exploram para fora do país o mercado de 40 milhões de veículos produzidos e consumo de 22 milhões. A matemática fala dos 18 milhões que precisam sair do país de origem para encontrar um lugar no mundo.
Mais do que isso, o pedido para acelerar a taxação dos eletrificados importados só reforça que os chineses souberam ler o nosso mercado e acertaram na estratégia. A indústria nacional deve sim ser protegida de uma possível concorrência que pode nesse momento ser injusta. Mas o jogo tem que ser jogado dentro da regra. E mudá-la antes do apito final é falta grave.
Acredito que diante dessa ebulição do mercado, quem está nos bastidores do segmento, a direção dos fabricantes locais, já imaginava que não seria nada fácil. Nem aqui nem em lugar nenhum do mundo.