Uma proposta do Ministério dos Transportes quer transformar a forma como os brasileiros tiram a Carteira Nacional de Habilitação (CNH). A ideia é dispensar a obrigatoriedade de frequentar Centros de Formação de Condutores (CFCs), as tradicionais autoescolas, para as categorias A (motocicletas) e B (carros de passeio). A medida visa reduzir custos e ampliar o acesso à habilitação, mas já provoca forte reação do setor.
Segundo o ministro dos Transportes, Renan Filho, a proposta busca democratizar o acesso à CNH, documento considerado essencial para oportunidades de trabalho, mobilidade e inclusão social. “A gente precisa baratear, utilizar as novas tecnologias, dar condição ao cidadão de ter formação digital, para que ele tenha conhecimento”, afirmou.
Atualmente, o custo para obter a habilitação gira entre R$ 3 mil e R$ 4 mil, o que torna o documento inacessível para boa parte da população. De acordo com estimativas do governo, 40 milhões de brasileiros em idade legal para dirigir ainda não possuem CNH, e o alto custo é um dos principais impeditivos. A proposta do governo pode reduzir esse valor em até 80%.
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Formação fora das autoescolas
No novo modelo, os candidatos ainda deverão ser aprovados nos exames teórico e prático aplicados pelos Detrans. No entanto, as aulas obrigatórias deixariam de ser exigidas, podendo o candidato optar por contratar instrutores autônomos cadastrados, estudar por conta própria ou, se quiser, seguir com as aulas nas autoescolas.
As 20 horas-aula de prática, que hoje são obrigatórias, se tornariam opcionais. A intenção é estimular uma formação mais flexível, baseada em competência e resultado nas avaliações, e não apenas no cumprimento de carga horária.
A proposta segue em análise pela Casa Civil e, se aprovada, será regulamentada por uma resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), responsável pelas normas do sistema de trânsito no país.
O governo afirma que a medida pode estimular a formalização de trabalhadores, especialmente em áreas como entregas por aplicativo e transporte de passageiros, além de combater desigualdades. “Se a família só consegue pagar uma CNH, normalmente escolhe pagar para o homem. A mulher fica de fora. Isso é excludente”, disse o ministro.
Experiências semelhantes já são adotadas em países como Estados Unidos, Canadá, Inglaterra, Japão, Paraguai e Uruguai, onde a preparação para os exames é de responsabilidade do cidadão, com base na confiança na autonomia individual.
Reação das autoescolas
Por outro lado, a proposta foi duramente criticada por representantes dos Centros de Formação de Condutores. Em nota oficial, a Federação Nacional das Autoescolas (Feneauto) afirmou que a medida ameaça a sobrevivência de cerca de 15 mil empresas e coloca em risco mais de 300 mil postos de trabalho diretos e indiretos.
A entidade também apontou que o anúncio foi feito de forma unilateral, por meio da imprensa, sem diálogo com os representantes do setor. “Mesmo com mais de seis pedidos protocolados, não fomos recebidos pelo Ministério desde a posse do ministro”, disse a entidade.
A Feneauto também alerta para os riscos à segurança viária. A proposta surge poucos dias após o Ipea divulgar um estudo mostrando o aumento do custo social dos acidentes de trânsito para o Sistema Único de Saúde (SUS). A flexibilização da formação, segundo a entidade, pode agravar ainda mais esse quadro.
“Educação no trânsito é uma política de segurança pública. Reduzir a exigência de formação é um retrocesso e contraria diretrizes de órgãos internacionais como a ONU”, afirma a federação.
Próximos passos
Ainda não há data para a implementação da medida. O projeto aguarda parecer da Casa Civil, que avaliará os impactos da proposta antes da regulamentação oficial pelo Contran.
O governo também não informou se pretende abrir consulta pública ou debater a proposta com os representantes do setor de formação de condutores. A expectativa é que, se aprovado, o novo modelo seja colocado em prática ainda em 2025





